terça-feira, 5 de novembro de 2013

Divagação Sobre o Amor

Estava eu em um lugar claro, uma luz que não oscilava, sempre a mesma intensidade. Diferente de todos os outros lugares que tenho estado recentemente, me fazia bem. Sentia-me anestesiado das frustrações que pensar em você, e nas outras, têm me causado. Admito que sempre tem uma em destaque, que está no foco da minha atenção, tristeza e desprezo.
De repente sou puxado para fora de minha zona de conforto, e toda a claridade, naquele segundo, se torna escuridão. Soava do outro lado da casa o alarme do meu telefone celular, pra me lembrar que nesse mundo, que é o real, tenho um limite até pra sonhar. Levantar da cama tem sido uma condenação. Me levanto, e penso em tudo que esperava fazer hoje, saio do meu quarto, me deparo com livros no sofá (os quais eu devia ler), meu computador e na porta o meu roupão.

Precisava de um banho. Pego o roupão na porta e me dirijo ao banheiro, vejo a bagunça pela casa, e crio mentalmente mais obrigações na esperança de que consiga evitar a torrente de pessimismo que tem me abalado. Devia ser mais organizado, limpo. Talvez devesse parar de me sentar com tanta frequência a frente do computador, parar de me anestesiar de minhas expectativas, mas percebi que à par disso só queria um banho. Então me vem um certo desprezo ao me lavar. Talvez não queira aceitar, quem sabe por querer ser demasiado diferente, de que a humanidade é uma espécie limpa.  Mas o drama de uma mente mal resolvida não é o foco, ou talvez seja, e eu negue por não gostar do quão clichê é transpor uma crise depressiva em coisas que outros vão ler. E mais uma vez me sinto humano, elitista, pelo desprezo que tenho dado com frequência a esse conceito universal de amor que nos joga em um precipício e nos deixa apenas a opção de rezar pra não chegar ao fundo.

Sento-me no sofá  e ao abrir o livro na página 201, por um instinto de observação que tenho praticado nos últimos dias, olho pra esquerda. Uma blusa pequena, cheia de adereços que dão à ela um aspecto de feminilidade, talvez quem sabe ainda tenha um resquício do cheiro que senti da primeira vez que te coloquei no colo. Uma troca de presentes, um pouco de atenção, enfim, tudo que eu precisava naquele dia. Lembro-me de ter sido melhor que suas expectativas, um pouco menos magro do que pensara, um pouco mais másculo e quiçá mais inteligente.
Será que me dei conta de que por três horas e dezessete minutos fui feliz sem pensar no quão pessimista continua sendo a minha visão sobre o amor? Mas creio que naquele dia, desde o primeiro instante, um pouco de pessimismo tinha-se guardado em meu peito, quem sabe não saía de mim como um cheiro. Exalava, ainda que em pequena quantidade, um tanto de minhas outras frustrações.
A expectativa... Não de uma relação mas de uma distração, que me afastasse de praticar o existencialismo e me colocasse naquele patamar de dignidade simplista que é o compromisso de uma dupla imaginária de amantes. Amantes um do outro? Ou seriam amantes de um pouco menos de solidão? O namoro devia ser feito com um contrato, pois quem sabe assim, a histeria de que tal relação é algo mais concreto que sentimento aquietaria meu desconforto por não conseguir seguir essas regras que medem a atenção que deve ser dada a sua parceira.

Quando um dia estávamos sentados em um desses cantos da faculdade, passaram por nós algumas de suas amigas. Certamente você pensou sobre o quanto eu as agradara, talvez sobre o quanto elas me desejariam, ou talvez não pensasse nada disso e eu não tenha desenvolvido um conceito realmente racional e inteligente sobre a mentalidade das mulheres. Acho que foi o último dia que você me aqueceu. Depois disso só consegui oscilar entre tratar tudo como uma competição, ou me entregar a alguém que queria competir (ou pelo menos acho que queria).
O passado é uma merda, pois assim como merda sempre deixa uma lembrança, como um cheiro, uma cor, um desagrado. E hoje não há vez que eu não olhe para aquela blusa e imagine as possibilidades que perdi sem um porque, ou sem um porque alheio a qualquer escolha que tenha tomado. Tudo isso me é estranho!

Quando me remeto a probabilidade de que as sensações que tenho ao olhar seus pertences, seu presente ou suas fotos, possa ser recíproco, acabo por me perder a pensar em minha própria inércia. Nossa inércia, que não tira de fato a existência de algo como "amor", mas tira do amor sua relevância.

Na última segunda-feira, estava sentado com um antigo amor. Ela me olhava, tinha as pernas carnudas sobre o encosto do banco o qual eu estava sentado, passou a mão sobre meu joelho e me fez a maldita pergunta: "você está bem"? Acho que eu estava bem. Queria agarrá-la, beijá-la, e quem sabe esquecer a paixão mais recente e fingir que ganhei uma competição que não existia. E na minha concepção, a vitória que tive ao evitar isso, foi ganhar imunidade a um desejo que surgiu sem meu consentimento. E naquele momento insisti em acreditar que tal ganho era estar bem.

Eis que ultimamente tenho olhado muito para os cantos. Creio que esperando te ver, a garota da blusa, em algum deles, e que você me note, e eu possa te olhar nos olhos, sorrir amarelo e virar o rosto trazendo para frente uma expressão de orgulho (orgulho de que?). Eis que ultimamente tenho tirado meu celular do bolso para atender qualquer alerta de mensagem. Querendo ler uma frase que tenha a palavra saudade e quem sabe no fim aceitarmo-nos de volta para que me sinta menos mal pelo fracasso de ser necessário a alguém por tão pouco tempo.

Claro que isso não passa de um rascunho dos meus constantes lapsos de baixa auto estima e solidão. Ou quem sabe, tenha criado um certo asco em relação ao amor, e no ápice de meus achismos, não soubera diferenciar amor de analgésico.

Pra completar quero ressaltar que isso não é exatamente um texto sobre alguém. Nem sequer é sobre um acontecimento, mas sobre como minha subjetividade lidaria com algo que quase fora uma relação.

PS: Que fique bem claro que eu ganhei essa última competição e permito-me por meio desse rascunho, que fiz com certo desdém devido ao desconforto de um conceito mal-resolvido sobre o que é gostar de alguém, ser imaturo.

segunda-feira, 21 de outubro de 2013

Autobiografia do Alheio

Ainda me lembro de quando aquele garoto era só uma criança. Uma criança que como qualquer outra, tinha amigos, brincava. Não era como aquelas que passavam por dificuldades desde cedo e terminavam como grandes martyrs da literatura ou da ciência. Às vezes me pergunto, será que alguém cuja excentricidade tenha sido seu marco de personalidade, teve uma infância completamente normal? Mas esse garoto era normal e teve essa fase marcada pela felicidade que parece que sempre provém de uma alienação mórbida, imparcial e eterna. Bom, eterna pelo menos enquanto dura a criancice.
A maior dificuldade sempre vem aos 14. "Idade complicada", segundo um velho senhor que encontrei na feira semana passada. Dizia ele que nessa idade todos os seus filhos encontraram dificuldades filosóficas. É uma idade em que se estabelece a dúvida entre achar que é diferente ou se adaptar às regras de vestuário que seus amigos lhe impõem.  Adotar um estilo alternativo tá bem na moda, tribos como punks, metaleiros ou emos são pessoas diferentes da sociedade, apesar de serem bem iguais entre si. E aquele garoto também achou que era uma ótima maneira de deixar sua marca. E que marca! Unhas pintadas de preto e cabelo na cara. Era como se carimbasse sua vaidade no rosto de cada maloqueiro que o encarava na rua e dizia: "sua bixinha".
A atenção que recebia era tanta. Eram tantos insultos que creio que por puro darwinismo ele começou a gostar de ser o contrário. Sim, isso mesmo, seu corpo e sua mente estavam se adaptando, criando mais uma dessas várias formas de pseudo humanos que vemos todos os dias. Pobres adolescentes, tão sorridentes, brincam e brigam o tempo todo. Parecem racionais mas a cada palavra que vem por impulso em suas mentes e num segundo é dita, sem reflexão, faz de suas consciências recipientes vazios. Gente jovem é vazia por dentro. E o rapaz o qual tenho falado queria perceber isso, mas quando se percebe algo tão, tão... Me faltam palavras pra dizer, mas perceber aquilo pra ele seria um tiro na têmpora.
Mas o que tinha de tão ruim em perceber as coisas? Ainda não tinha nada. Mas algo dentro dele gritava por explicações. Queria explicar pra si mesmo o motivo de uma mentalidade (se é que isso é possível). O que ele queria... Queria explicar um ser humano normal como se fazem com animais selvagens cuja vida é mostrada em um documentário do NatGeo. Será que ser normal era tão desinteressante assim? Às vezes acho que supervalorizamos "gênios" em suas excentricidades. E esse carinha aos 14 anos achava a mesma coisa.
A vida pra ele se tornou um relatório. Descrever era algo necessário. "Há mais ciência e história em pegar um ônibus lotado que em todo o acervo de uma biblioteca universitária" dizia ele. E até que ele ficou bom nisso. Em pouco tempo conseguia deduzir mais de um mendigo com uma conversa de botequim do que conseguira deduzir sobre Hitler em todas suas leituras sobre a guerra fria. Estava provando a si mesmo que estava certo, não importava o quanto os intelectuais dissessem o contrário ou não dessem a mínima pra isso.
E dentro de um útero de observações não-sentimentais aquele garoto cresceu. Teve várias namoradas cujo relacionamento durava pouco tempo, mas depois de um tempo ele nem se importou mais. Não tinha um amor, mas ainda tinha sua liberdade. Liberdade de fazer de tudo e de todos um objeto de pesquisa. Não se julgava um intelectual. Se julgava melhor que um. Era uma pessoa que vivia suas próprias filosofias, não estava estagnado, não era um repetidor de discurso como seus professores de faculdade. Ser retrógrado em suas opiniões era algo insuportável.
Mas o mundo não é tão simples. "Querer não é poder" como dizem os parentes desde os primórdios da humanidade. Na verdade, acredito que o mundo seja um conflito de quereres. Muitas pessoas querendo muitas coisas, quereres resultando em ações, e ações resultando em alterações de coisas. E se o mundo é um lugar tão cheio de pessoas e de quereres, alguns deles hão de se perder no meio de outros. E foi o que aconteceu, pois do outro lado da sala 15 havia uma garota que o quis. E como o quis! Quis tanto que ele sucumbiu, e por dois anos esquecera de fazer o bendito relatório mental que fazia sobre todos os seres humanos. Mas porque não um relatório sobre ela? Afinal, ela era ou não humana? Acho que tanto pra ele quanto pra qualquer outro indivíduo normal, cônjuges são como divindades, anjos que nos salvam de fazer da vida uma ciência. Afinal de contas viver é uma experiência inexplicável (será?).
E os anos passaram. Anos em que seu coração estava cheio e sua mente vazia. Teve dois filhos. E cada dia trabalhando na receita federal, por mais cansativo que fosse, era recompensado no final deste com uma cervejada com seus amigos e um jantar com a sua esposa. A lógica havia acabado. Tudo havia se tornado um fluxo de neurotransmissores que deram a ele uma felicidade constante, duradoura e completamente irracional.
Mas o que ele queria mais? Ser feliz, ou ser aquele personagem cuja capacidade de observação era afiada como uma navalha? Não dava pra ser os dois. Pois felicidade se sente, e quando não se sente é necessário que não se sinta nada até que possa se sentir de novo. E na décima segunda briga que o casal enfrentou, essa a qual fora a única relevante em todo o relacionamento, aquele garoto que agora era um homem decidiu se isolar. Se isolar pra pensar. E pensando abriu uma cerveja, mas não ficou bêbado. Quem dera tivesse ficado, pois cerveja quando não se bebe para embriagar estimula a criatividade. E a criatividade foi tanta que ele acabou criando pra si um motivo pra não voltar mais a seu antigo amor ou à seus filhos. Voltaria a ser aquele rapaz sagaz e observador. E voltou a ser.
Aos poucos a sede de conhecimento retomou o seu dia-a-dia. Cada pessoa, cada lojista, cada gesto, tudo ele via e relatava. Criou em sua mente enciclopédias de suas deduções. Tudo era fascinante, e fascinante era nada. E mentalmente se vangloriava por ter jogado fora sua humanidade comum em prol de sua necessidade de criar concepções pra tudo e pra todos (ou interpretar as concepções de um outro). Havia transcendido o resto, e o resto eram as pessoas felizes e infelizes, mas que diferente dele sentiam algo ou outra coisa.
Mas havia uma coisa que não conseguia deduzir. Talvez tivera deduzido a crise de saudades que sentia da esposa pela quantidade de ocitocina que fica na corrente sanguinea depois de uma experiência sociológica tão forte como o casamento. Mas correntes sanguineas podem ser alteradas, e resolveu alterar a sua com cigarros.
Fumar para ele era uma dor menor do que se sentir humano (se é que era capaz de sentir alguma dor). E com um amontoado de tabaco no bolso continuou sua jornada em busca do conhecimento que a vida lhe trazia cheia de humildade.
Mas transcender um humano não significa viver mais. Talvez significasse viver menos, e apesar de não ser mais gente como a gente, ainda tinha dentro de si um pulmão e dentro de um pulmão um carcinoma. Estava morrendo e não sabia se desesperar com isso.
Não culpou o cigarro. Pois dentro de todas as suas teorias não havia uma memória ou informação que o dissesse se era pior ter câncer ou um amar alguém. E apesar do diagnóstico continuou com seu vício, afinal de contas parar agora seria desenfrear em si todo aquele sentimento retido pela nicotina.
Seriam alguns meses a mais para terminar sua obra que nunca seria publicada, pois era complexa demais pra mentes que não eram como a dele. Mentes de meros homo sapiens.
Após algumas caminhadas de poucas novidades, devido ao fato de ter que revezar os olhares ativos e a tosse, caiu em um desmaio do alto de uma cadeira daquelas altas de mini lanchonetes de rua. Foi levado ao hospital e sua família avisada às pressas.
Família difícil de se achar depois de 5 anos de êxodo em que o pobre cancerígeno e supra humano viveu.
Eis que chegou a esposa, os filhos e um outro cara. Cabelos grisalhos, queixo grande e uma camisa que exalava a dinheiro. Sua esposa havia se casado. Não sabia o que pensar. Na verdade pensava, mas não sabia. Deduzia daquele homem o que ele devia ser, afinal de contas, ninguém era diferente. Na certa devia ser um empresário, pois só empresários tinham olhares que se proclamavam com tamanha superioridade. Mas o intrigava ainda mais os olhares da esposa e dos filhos. Nunca havia os visto chorar. Em 10 anos de casamento, talvez tivesse ignorado cada lágrima. Afinal era feliz, e os felizes não consideram as lágrimas, essa era sua lógica. Sua concepção de felicidade não incluía o sofrimento. Percebeu que mesmo nos momentos em que fora normal, não se permitia uma ambiguidade de sentidos.
A esposa se jogou aos pés da cama segurou sua mão, e se entristeceu um pouco mais. Os filhos um pouco mais crescidos também tinham os olhos rasos d'água. O atual marido de sua esposa se mantinha distante tentando projetar em si a sensação de ser um homem de respeito com os moribundos.
O pé-na-cova não disse nada. Não sabia o que dizer ou estava ocupado demais prestando atenção em cada gesto, cada dedo que se mexia em um espasmo, cada piscadela, uma sobrancelha que se levantasse e se encheria de um significado.
Mas sua concentração foi quebrada quando ao lado de sua cama apitou um aparelho e seus olhos se fecharam contra sua vontade. Interromperam sua busca de uma verdade. Ou talvez a verdade daquele momento fosse que ele simplesmente como qualquer outro humano estava morrendo. Não era diferente de outros casos. Era uma massa rosada que ficaria cinzenta tanto em sua cabeça como fora na cabeça de qualquer outro gênio.
Não havia se despedido de sua família. Talvez tivesse se despedido em seus relatórios com um "PS" no rodapé. Mas na presença deles não disse. E morreu sem saber se viveu. Afinal o que é a vida, uma busca de conhecimento ou uma entrega a sensações? Nunca soube dizer. Mas após ter perdido o seu corpo e seus órgãos pararem, sua vista partir, seus pés gelarem, num ataque rápido de epifania lhe veio a certeza de que nunca fora feliz e sua enciclopédia se dissipou e tudo se escureceu.
Não foi uma morte grandiosa. Nenhuma morte é, e talvez nenhuma existência seja.
Mas como em toda morte havia algo pelo que se arrepender. Pois existimos de forma limitada, e o limite é a parede que o separava de um todo que sempre quis.
O que me resta é pensar, será que ele era mesmo diferente? 
Talvez tão diferente quanto qualquer um possa ser ou seja.

Ele era diferente, mas não era tão diferente assim.

quarta-feira, 25 de setembro de 2013

Indescritível Amizade

Era uma noite diferente. Não por ser um momento que eu possa considerar incrível na minha vida, mas voltar das aulas com companhia é uma situação rara pra mim.
Eis que eu e meu amigo vinhamos subindo a avenida, conversando tranquilamente sobre as vantagens de não encher a cara em shows de Rock'N Roll, até que um sujeito me grita: -E aí cara, beleza?
Dizia ele: -Sou eu, Fernando, trabalhava na loja, e agora tô aqui tocando minha vida. Trabalhando por conta própria.
Sim, como não o reconheci? Era o Fernando, meu amigo Fernando, que há muito tempo não via. Ou talvez tivesse visto, e não viesse a minha cabeça que aquele era o Fernando, companheiro, conhecido, tinha emprego numa loja que também não me chegava a memória.
Cumprimentou-me sorridente, com a boca faltando alguns dentes. Pensei comigo mesmo: ele deve ser uma figura conhecida no lugar que trabalha. Um visual ligeiramente diferente do padrão estereotipado que vemos nos lojistas de hoje em dia. É sempre a camisa gola polo, a calça jeans azul e um tênis de marca com algumas molas no calcanhar. Mas ele era um cara estiloso, sua banguela ressaltava o árduo serviço que fazia, sua bermuda surrada mostrava alguém que trabalhava por prazer e havia deixado de lado qualquer conceito consumista.
Então eu olho para seu humilde balcão, alguns potes parecidos com aqueles que meu pai comprava. Um pó de cor marrom que servia como descongestionante nasal. Entrega a mim e meu camarada que me acompanhava, duas unidades do seu produto, explicando sucintamente o poder de seu miraculoso remédio. Curava acne, frieira, rinite, pano branco e várias outras micoses que não recordo.
E o melhor, era grátis. Um pequeno agrado, para que o ajudássemos a divulgar o seu maravilhoso produto. Tudo que ele pedia era que eu honrasse nossa amizade. Que trouxesse a ele o sucesso em suas vendas.
Mas o que veio a seguir, foi de partir o coração. Abaixando o tom de voz, meu caro colega vendedor, começa a dizer que estava faminto.
Como pode um trabalhador honesto passar por tal crise? É um absurdo. Raras farmácias vendem um medicamento tão potente quanto o seu.
Fitou a mim e a meu amigo e pediu carinhosamente para que o ajudássemos a comprar um marmitex, e enfim, retornasse a seu lar com seu estomago saciado. Tirei a carteira do bolso sem pensar, afinal, sempre gostei de ajudar pessoas do meu círculo de amizade.
Verifiquei em todos os cantos, mas foi em vão, meu dinheiro havia acabado. Só encontrei um mísero real. O companheiro que estava comigo, nem isso conseguiu.
Ele nos olha, desapontado, diz que o dinheiro não daria pra satisfazer seu apetite, e então em dois gestos pega os potes de nossas mãos, e a moeda que estava entre meus dedos. E triste com o fato, nos dá boa noite e vira as costas.
Fomos embora embasbacados. Não tanto por não termos tido condições de ajudar o intrépido vendedor, mas porque me dei conta de que não fazia ideia de quem era Fernando.

Como eu queria ter ajudado meu desconhecido amigo.

quinta-feira, 19 de setembro de 2013

Sobre Banhos e Casa de Avó

Viajar, visitar parentes, nunca fez parte do meu cotidiano.
Mas desde que comecei a fazer faculdade, morar em uma cidade relativamente grande (se comparada a minha pequena Orizona), se tornou algo comum pra mim.
E neste último fim de semana, na falta de dinheiro decidi ir visitar minha avó, que mora em Anápolis-GO.
Penso que a visita não foi exatamente a ela, e sim a meu primo depressivo, que estava sozinho em casa, e cogitava companhia.
Ficar na casa de outra pessoa é algo que levo com tamanha naturalidade que não percebo sequer o quanto sou folgado mesmo estando em um lugar ao qual não pertenço.
Todavia, sempre tem uma parte que me intriga.

Tomar banho em uma casa que não é a sua é uma experiência única de terror.
Várias vezes me acontece de estranhar a quantidade de xampu em cima da pia, ou o quanto algumas pessoas gostam de guardar sabonetes ressecados.
E quando tais sabonetes se encontram cheio de fiapos de cabelo, e você fica se perguntando se seria os pelos pubianos do seu primo, ou fios de cabelo do penteado curto da sua avó?
Mas tais preocupações são demasiadamente comuns se comparadas a que vou contar aqui.

Há dois anos tenho um grave problema chamado caspa. Ou eu lavo meu cabelo com xampu anti-caspa ou sou obrigado a sair de casa com ele oleoso.
Por sorte, olhei para o canto, próximo ao vaso sanitário e encontrei o xampu anti-caspa do meu primo.
"Clear Men" era o nome. Sim, aquele cuja propaganda atuava ninguém mais ninguém menos que o grande jogador de futebol, Cristiano Ronaldo.
Mas não uma versão qualquer. Por curiosidade estava lendo a embalagem, e descubro que em sua composição havia mentol.

Estar defronte daquilo, prestes a esfregar seu conteúdo em meu couro cabeludo me atiçava a curiosidade:
Qual seria a sensação de um banho mais refrescante que o normal?
Seria como estar em uma propaganda do creme dental "Sorriso".
Enfim molhei a cabeça por completo, despejei uma boa quantidade do produto em minha mão direita e comecei a esfregar.
Tudo bem normal até aqui.

Ao terminar o enxágue, foi uma sensação engraçada.
Não sei se era refrescante, não sei se só estava ardendo. Sentia-me usando um capacete feito de Halls extra forte.
Mas havia ainda algo que eu não contava que iria acontecer.
O maldito xampu escorreu por minhas costas.
Sim, por toda as costas.
Sim, até minhas pernas.
Então vim aqui contar a vocês essa pequena crônica, afinal de contas, nunca na minha vida havia ficado com o ânus tão refrescante.

Ainda bem que não tenho hemorróidas.