quarta-feira, 25 de setembro de 2013

Indescritível Amizade

Era uma noite diferente. Não por ser um momento que eu possa considerar incrível na minha vida, mas voltar das aulas com companhia é uma situação rara pra mim.
Eis que eu e meu amigo vinhamos subindo a avenida, conversando tranquilamente sobre as vantagens de não encher a cara em shows de Rock'N Roll, até que um sujeito me grita: -E aí cara, beleza?
Dizia ele: -Sou eu, Fernando, trabalhava na loja, e agora tô aqui tocando minha vida. Trabalhando por conta própria.
Sim, como não o reconheci? Era o Fernando, meu amigo Fernando, que há muito tempo não via. Ou talvez tivesse visto, e não viesse a minha cabeça que aquele era o Fernando, companheiro, conhecido, tinha emprego numa loja que também não me chegava a memória.
Cumprimentou-me sorridente, com a boca faltando alguns dentes. Pensei comigo mesmo: ele deve ser uma figura conhecida no lugar que trabalha. Um visual ligeiramente diferente do padrão estereotipado que vemos nos lojistas de hoje em dia. É sempre a camisa gola polo, a calça jeans azul e um tênis de marca com algumas molas no calcanhar. Mas ele era um cara estiloso, sua banguela ressaltava o árduo serviço que fazia, sua bermuda surrada mostrava alguém que trabalhava por prazer e havia deixado de lado qualquer conceito consumista.
Então eu olho para seu humilde balcão, alguns potes parecidos com aqueles que meu pai comprava. Um pó de cor marrom que servia como descongestionante nasal. Entrega a mim e meu camarada que me acompanhava, duas unidades do seu produto, explicando sucintamente o poder de seu miraculoso remédio. Curava acne, frieira, rinite, pano branco e várias outras micoses que não recordo.
E o melhor, era grátis. Um pequeno agrado, para que o ajudássemos a divulgar o seu maravilhoso produto. Tudo que ele pedia era que eu honrasse nossa amizade. Que trouxesse a ele o sucesso em suas vendas.
Mas o que veio a seguir, foi de partir o coração. Abaixando o tom de voz, meu caro colega vendedor, começa a dizer que estava faminto.
Como pode um trabalhador honesto passar por tal crise? É um absurdo. Raras farmácias vendem um medicamento tão potente quanto o seu.
Fitou a mim e a meu amigo e pediu carinhosamente para que o ajudássemos a comprar um marmitex, e enfim, retornasse a seu lar com seu estomago saciado. Tirei a carteira do bolso sem pensar, afinal, sempre gostei de ajudar pessoas do meu círculo de amizade.
Verifiquei em todos os cantos, mas foi em vão, meu dinheiro havia acabado. Só encontrei um mísero real. O companheiro que estava comigo, nem isso conseguiu.
Ele nos olha, desapontado, diz que o dinheiro não daria pra satisfazer seu apetite, e então em dois gestos pega os potes de nossas mãos, e a moeda que estava entre meus dedos. E triste com o fato, nos dá boa noite e vira as costas.
Fomos embora embasbacados. Não tanto por não termos tido condições de ajudar o intrépido vendedor, mas porque me dei conta de que não fazia ideia de quem era Fernando.

Como eu queria ter ajudado meu desconhecido amigo.

Um comentário: